Perambulando em Valparaíso passei
por uma feirinha onde havia um vendedor de livros usados. Já estava interessada
em conhecer um pouco da literatura chilena, e essa foi a oportunidade. Comprei
um livro de páginas amareladas da Isabel Allende, uma das mais conhecidas
escritoras chilenas. Calhou também do livro se chamar Eva Luna, nome próprio,
apropriado para o Desafio Literário deste mês, além de ser uma desculpa para
treinar minha leitura em espanhol.
Pois bem, o livro já começa com
uma frase marcante, que diz muito sobre a protagonista e narradora do romance: “Me
llamo Eva, que quiere decir vida, según um libro que mi madre consultó para
escoger mi nombre”. Eva é filha das chamas entre Consuelo e um índio jardineiro
em seu leito de morte. Consuelo, sua mãe, mulher desgarrada de raízes, com
poucas emoções em sua vida, empregada de um médico que embalsamava cadáveres
com um líquido misterioso, criou a filha de forma simples, e a ensinou a contar
muitas histórias fantásticas e criativas. Após a morte da mãe, viveu como
empregada de casa em casa, nas quais trabalhava, sonhava e, vez por outra, aprontava
em protesto ao comportamento dos patrões. Quando finalmente fugiu para as ruas,
sua habilidade de contar histórias a salvou por diversas vezes, e incitou a
simpatia de muitos. A epígrafe do livro já dá pistas desse fato, pois é uma
citação sobre Sherazade, das Mil e Uma Noites. Enquanto Eva Luna cresce e
adquire sabedoria, o país no qual se passa a história sofre uma crise severa
devido à ditadura. Não há menção direta à qual seria esse país, mas levando em
consideração a nacionalidade da autora e a história sangrenta e pesada de
ditadura do Chile, presume-se que esse seja o país de Eva. A ditadura, como se
espera, é tratada como o mal, um atraso, um retrocesso pela população do local.
O próprio amante de Eva está envolvido no combate à ditadura. Humberto Naranjo
é um homem criado na rua, com modos rudes, que, com o tempo, encontra sua
vocação: liderar uma guerrilha revolucionária contra o sistema. Apesar de
admirar Humberto, sabemos desde o início do livro que a verdadeira paixão de
Eva seria Rolf Carlé, cuja história é contada em paralelo. Rolf, dono de um
passado doloroso e marcante, é um jornalista que documenta o movimento de guerrilha
liderado por Naranjo.
Isabel Allende |
Uma história com um fundo
político e idealista forte, com um imaginário fantástico acoplado aos fatos do
dia a dia que só escritores sul-americanos são capazes de fazer, e um enredo
envolvente que, mesmo lendo em espanhol, dá vontade de continuar pra sempre,
Eva Luna foi um ótimo livro de iniciação à literatura chilena. Agora devo
procurar obras de outros nomes de peso, como Gabriela Mistral e Roberto Bolaño,
para rechear as leituras dos nossos escritores vizinhos.
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